24/06/2019 – O setor de combustíveis no Brasil vive uma fase turbulenta. Além de toda a variação de preço e pressão da população, outro fator tem movimentado bastante o segmento energético. Trata-se da venda direta de etanol para os postos. A medida é cercada de prós e contras, mas, de acordo com o Senador Otto Alencar (PSD-BA), autor de um dos projetos sobre o tema, o objetivo é aumentar a concorrência no mercado de combustíveis e, consequentemente, diminuir o preço final para o consumidor.
O parlamentar defende o projeto, lembrando que o texto não vai proibir nenhuma distribuidora credenciada pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) de atuar. Mas que abrirá oportunidades para que surjam outras empresas do ramo, inclusive no Nordeste.
“É uma forma de aumentar a competitividade e baixar o preço do álcool hidratado na bomba, que sai a R$ 1,57 da usina e é vendido a R$ 3,50 na bomba. Há distribuidoras que são credenciadas pela ANP e, como tal, dominam o mercado em um oligopólio que precisa ser quebrado no Brasil” afirma.
Hoje, mais de 70% do mercado de distribuição está concentrado nas mãos das três maiores empresas do setor: BR (Petrobras), Raízen (Shell) e Ipiranga. Para os produtores, caso a venda seja feita diretamente para os postos, eliminando a intermediação das distribuidoras, o preço ficará mais baixo para o consumidor.
Diretor fundador da Valêncio Consultoria em Combustíveis, empresa especializada em gestão do mercado de petróleo e derivados, Bruno Valêncio acredita que a medida terá impacto forte nos postos sem bandeira. Para ele, os estabelecimentos “bandeirados” não terão vantagem em relação à medida, já que têm contrato de exclusividade com as distribuidoras, ou seja: são obrigados a comprar gasolina, diesel e etanol das empresas com as quais têm contrato.
Os maiores favorecidos serão os postos “bandeira branca”, que já desfrutam atualmente de condição comercial mais competitiva que os bandeirados. Tanto por questões econômicas, como por praticarem uma forma de compra programada, de acordo com a necessidade e preço.
“Para estes postos, a liberação da compra do etanol direto das usinas proporcionará mais competitividade ainda”, diz o especialista, que estima que o combustível pode ter uma queda média mínima de R$ 0,10/litro nesta eliminação da cadeia de distribuição.
Por meio de nota, a Associação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis (Plural) se posiciona favorável à venda direta para os postos. Porém, a entidade ressalta a importância de igualdade na competitividade do mercado. Porém, acredita que não haverá diminuição no preço do etanol, pois “haverá perda de otimização logística atual”.
“Caso a venda direta seja aprovada agora, sem observância de questões tributárias, os aspectos fundamentais para a competitividade do setor serão lesados, com risco ao aumento da sonegação. O aumento de volume no modal rodoviário significa um retrocesso no desenvolvimento almejado por toda a sociedade, contraria os pilares de eficiência logística do Plano Nacional de Logística (PNL)”, completa o comunicado.
O presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), Paulo Miranda Soares, também critica que a medida seja feita sem um estudo prévio. Para ele, isso pode inviabilizar o etanol em determinadas regiões do país.
“Atualmente, temos oito estados produtores e 19 que não produzem etanol. Por questões de preço, de frete e logística, algumas regiões do país que não são produtoras podem ficar sem esse combustível, tornando o etanol um produto regional destinado apenas aos estados produtores. Uma medida que visa diminuir o valor do etanol pode acabar saindo pela culatra”, alerta.
Ainda de acordo com o executivo, a Federação não é contra a medida, mas, assim como a Plural, também se preocupa com a questão fiscal. “A maior preocupação, sem dúvida, é com a questão tributária. Precisamos salientar que essa medida pode facilitar a sonegação. Se hoje, com condições favoráveis, o estado não dá conta de fiscalizar, visto as inúmeras apreensões divulgadas pela imprensa, imagina com essa facilidade. É necessária uma reforma tributária para coibir essa prática e evitar esse tipo de problema”, contou.
Bolsonaro é favorável à medida
Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro defendeu a venda direta de etanol das usinas para postos de combustíveis. “O caminhoneiro roda 400 quilômetros para entregar o combustível para a distribuidora, que terá o trabalho e custo de redistribuir esse combustível, sendo que há postos a dois quilômetros das usinas”, disse o presidente em entrevista à Rádio Bandeirantes.
Em nota, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), afirma que deseja estabelecer um diálogo produtivo com os órgãos governamentais e oferecer alternativas que garantam uma racionalização do sistema tributário, em linha com os atuais esforços do Governo Federal, e permitam uma menor incidência da atual carga tributária sobre o setor produtivo.
Para a associação, a não obrigatoriedade das distribuidoras na cadeia (chamada de monofasia pelo setor), “talvez não seja a melhor solução para a estruturação do modelo de venda direta, visto que trará uma maior concentração de tributos penalizando tanto as usinas quanto os produtores de cana-de-açúcar com um aumento da carga em até 85% somente de PIS/COFINS”.
De acordo com a ANP, a avaliação técnica preparada pelos técnicos da agência não indica obstáculos para a implantação da venda direta de etanol. “Ela possivelmente teria impacto positivo na concorrência e nos preços praticados. A qualidade seria mantida pelo produtor, que teria que seguir as mesmas regras do distribuidor. E a logística do produto seria favorecida com a criação de mais uma alternativa de suprimento. A única questão pendente é o estabelecimento da monofasia tributária do PIS/Cofins”.
Na última semana, os senadores aprovaram o projeto 61/2018 para sustar uma resolução da ANP (nº 43, de 22 de dezembro de 2009) que impedia a venda direta de etanol para os postos de combustível. Para o autor da proposta, senador Otto Alencar (PSD-BA), da forma como está hoje, a resolução da ANP desfavorece a concorrência. A matéria agora segue para a Câmara dos Deputados para votação.
Fonte: Fecombustíveis